Líderes comunitários e empresários de Taguatinga se uniram para lutar pela área de cidade
Quando foi criada, em junho de 1958, a Região Administrativa de Taguatinga ostentava imponentes 46,2 mil hectares. Cinquenta e um anos depois, a cidade está bem perto de ficar com apenas 20% do que já foi, graças à definição das poligonais de Vicente Pires e Águas Claras. Preocupados com o encolhimento da cidade, lideranças comunitárias e empresários se uniram para lutar pelos últimos metros quadrados disponíveis na região.
Taguatinga estava entre as oito primeiras cidades criadas no Distrito Federal, junto com Gama, Planaltina e Sobradinho. Nos últimos 50 anos, o terreno original foi fatiado para dar origem a Ceilândia e Samambaia, que viraram Regiões Administrativas (RAs) em 1988 e 1989, respectivamente, e, mais recentemente, para compor Águas Claras e Vicente Pires (veja cronologia). São os limites com as duas novas regiões administrativas que mobilizam os taguatinguenses.
A primeira proposta da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (Seduma) para a poligonal de Taguatinga retirava da cidade o Taguaparque, o Parque Ecológico Boca da Mata e o Centro Regional. O primeiro ficaria com Vicente Pires, o segundo com Samambaia e o Centro Regional, com Águas Claras. Ainda correu o risco de perder parte do Pistão Sul, outra região histórica da cidade.
Insatisfeitos e quase ofendidos perante a possibilidade de perder um fruto de lutas históricas como o Taguaparque, políticos e moradores da cidade fizeram uma contraproposta, que inclui no território da cidade os três pontos em discussão. “Nenhuma autoridade disse nada quando Taguatinga perdeu terreno para Ceilândia e Samambaia. Agora, que perdemos quase tudo, não podemos abrir mão de nada”, reclama o aposentado José Honório da Silva, 73 anos, um dos pioneiros que ajudaram a erguer Taguatinga.
Consequências
Mesmo juntando tudo que poderia ser perdido na discussão das poligonais, não sobram mais que 8,9 mil hectares para Taguatinga. “A revolta dos taguatinguenses é generalizada. Não há mais expectativa de crescimento da cidade”, reclama o administrador regional de Taguatinga, Gilvando Galdino. Cercada por oito RAs, Taguatinga não tem mais espaço para crescer e, para piorar, metade da área que sobrou está reservada à preservação ambiental. “Taguatinga ficou ilhada, só pode crescer para cima, e isso vai inflacionar as moradias”, prevê o administrador.
O encolhimento da cidade veio acompanhado por consequências graves para moradores e empresários da região. O maior símbolo da falta de espaço é a transformação do Setor de Indústria em área de ocupação mista, que ocorreu em 1998. Com moradias na região, as indústrias, que já não tinham espaço físico para crescer, são obrigadas a restringir seu trabalho ao horário comercial, para não atrapalhar os vizinhos.
“Nossa expectativa é de que o setor se transforme em residencial nos próximos 10 anos”, lamenta o presidente da Associação Comercial e Industrial de Taguatinga, José Sobrinho Barros, que enxerga na especulação imobiliária força para sobrepujar as indústrias da região. Sobrinho não se conforma com o fato de Águas Claras, que surgiu como bairro de Taguatinga, ter ficado com um espaço destinado à expansão do Setor de Indústrias. “Daqui a pouco, Taguatinga vai se resumir à Praça do Relógio”, provoca.
O distrital Benedito Domingos, que já foi administrador de Taguatinga e alertou a Câmara Legislativa para a necessidade de manter regiões históricas como o Parque Boca da Mata, lamenta que a cidade tenha sido espremida, mas diz que, apesar do encolhimento, sobrou espaço para expansão. “Nossa proposta de poligonal reserva a área da Cana do Reino para a futura expansão econômica da cidade”, comenta o deputado. A região, contudo, também interessa à comunidade de Vicente Pires.
Censo
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reconhece apenas 19 das 30 regiões administrativas do DF. Para evitar distorções no Censo do próximo ano, o GDF precisa fixar as poligonais de 11 cidades, como Estrutural e Varjão.
Atendimento
A Administração de Taguatinga planeja preencher a área conhecida como Centro Regional com instituições como as delegacias de polícia e da mulher e um quartel para o Corpo de Bombeiros.
» Sem espaço para crescer
O Setor de Indústrias de Taguatinga deixou de abrigar apenas empresas em março de 1998. A nobre localização das indústrias, que ficam no meio da cidade, levou a administração a estabelecer em seu Plano Diretor Local (PDL) que a área poderia ser ocupada por residências. Os moradores de Taguatinga ganharam mais opções de habitação, mas a mudança prejudica as indústrias até hoje. Uma empresa da região chegou a ser acionada judicialmente há seis anos para não funcionar mais à noite.
À época, a fábrica também sofreu intervenção da polícia, que proibiu os funcionários de continuar o trabalho por causa de reclamações dos moradores. “Fomos forçados a fechar o turno da noite, o que gerou demissões e diminuiu o rendimento”, lamenta uma representante da empresa, que pede para não ser identificada.
Quem moveu a ação judicial contra essa empresa foram os moradores de um prédio vizinho. O edifício fica exatamente ao lado da fábrica. “Era impossível dormir. Ouvíamos, durante a noite inteira, o barulho ensurdecedor de serras elétricas e pancadas de ferros”, conta o subsíndico do condomínio, Wilden Guimarães, 42 anos. Segundo ele, a qualidade de vida na região melhorou bastante, desde que a empresa foi obrigada a controlar os ruídos emitidos no período noturno.
Algo semelhante ocorreu com as empresas Empremon Equipamentos, Mehta Transportes e Serviços e Amor em Grão, que distribui café. Todas passaram a trabalhar em apenas um turno de oito horas. “Além de motivar demissões, a mudança aumentou nossos custos”, conta Manoel Adorno, diretor-geral das três empresas.
Adorno lembra que a transformação do Setor de Indústrias em área de ocupação mista veio acompanhada pela promessa da transferência das empresas para uma outra região. O plano, segundo o gerente de Planejamento da Administração de Taguatinga, Allied Tonin, era empurrar as empresas para a Área de Desenvolvimento Econômico, próxima à Estrutural, mas foram poucas as fábricas que mudaram de lugar. (RB)
» Cronologia
1958
Taguatinga é fundada em 5 de junho em terras do município de Luziânia (GO), na Fazenda Taguatinga, a oeste de Brasília.
1964
A Lei nº 4.545 divide o Distrito Federal em Regiões Administrativas (RAs). Dois anos depois, o Decreto nº 448, de 8 de fevereiro de 1966, estabelece os limites das regiões, concedendo uma área de 46.225 hectares para Taguatinga.
1988
O Decreto nº 11.193, de 8 de agosto de 1988, fixa novos limites para as RAs. Taguatinga é praticamente dividida ao meio para dar origem a Ceilândia, que fica com 23.231 dos seus hectares. A Taguatinga restam 23.023 hectares.
1989
Samambaia leva outros 10.868 hectares de Taguatinga (Decreto nº 11.921, de 25 de outubro de 1989). A RA III fica com 12.155 hectares.
1998
O Setor de Mansões de Samambaia passa a fazer parte de Taguatinga, cuja área aumenta para 12.453 hectares
(Lei Complementar nº 90, do dia 11 de março).
2003
Águas Claras se torna região administrativa, conforme
a Lei nº 3.153, de 6 de março.
2009
Vicente Pires vira uma região administrativa. Caso a proposta da Administração de Taguatinga seja aceita como foi proposta, a cidade ficará com apenas 8,9 mil hectares.
